segunda-feira, 19 de setembro de 2011

UM GLOSSÁRIO VANTILIANO - PARTE FINAL

Segue a terceira e última parte do Glossário Vantiliano. A Primeira e Segunda partes você encontra nos links: Parte 1 e Parte 2. Pedimos que, se porventura, houver algum erro na tradução e quiser ajudar a corrigir, por favor não se acanhe e envie sua sugestão. Esperamos que este pequeno glossário venha a ajudar os leitores de língua portuguesa que vem a ter os primeiros contatos com a literatura de Cornelius Van Til que tem sido traduzida. Em breve postaremos mais textos voltados aos estudos sobre Van Til. Bom proveito a todos.

Traduzido com algumas adaptações, como por exemplo, as numerações dos verbetes. O artigo original encontra-se em ordem alfabética. As notas de rodapé são do tradutor.

Por John Frame

41. Problema do Um-e-Muito:[1] Conhecimento envolve unir particulares dentro de categorias universais. Mas, se cada particular é exaustivamente descrito por categorias universais, então não é mais particular. Mas, se alguns particulares não podem ser descritos por categorias universais, então elas não pode ser conhecidas, ou elas não tem natureza. O mesmo problema pode ser descrito em termos de relações lógicas ao fato, e do sujeito ao objeto. Ver Bahnsen, 706; Frame, 63ss.

42. Ponto de Contato: uma crença sustentada em comum entre duas pessoas que os permitem raciocinar em direção ao um acordo. Em VT, particularmente o ponto de contato entre crente e incrédulo. Para VT isto é encontrado, não em visão comum do mundo, mas no verdadeiro conhecimento de Deus que os Crentes têm, e os Incrédulos também têm, mas suprimem. Ver Bahnsen, 105, n.

43. Predicação: atribuir um predicado ao sujeito; por conseguinte, fazer uma afirmação. VT diz que apenas a Cosmovisão Cristã torna a predicação possível.

44. Pressuposição: (1) uma crença que precede outras crenças; (2) uma crença que governa outras crenças; (3) pressuposição última: a crença que governa todas as outras crenças, ou o comprometimento mais fundamental do coração.

45. Probabilidade: O grau em que uma proposição se aproxima da certeza. VT acreditava que o Cristianismo era exato, não uma mera probabilidade, e que, pois, para um apologista reivindicar mera probabilidade é negar a clareza da Revelação de Deus.

46. Prova: Um argumento que estabelece a verdade de uma conclusão. VT acreditava que existia “prova absolutamente exata” do Teísmo Cristã por meio de seu argumento transcendental. Ver Bahnsen, 78 – 82.

47. Diferença Qualitativa / Quantitativa: Na controvérsia com [Gordon] Clark, estes termos designaram visões diferente da incompreensibilidade de Deus (q.v). Clark negava sustentar uma visão “simplesmente quantitativa” (que Deus conhece mais proposições do que nós), porque ele mantinha que Deus conhece o mundo de um modo diferente do Homem. Van Til achou ser insuficiente a visão de Clark da diferença, mas ele recusou-se a declarar precisamente a diferença que ele referiu-se como “qualitativa”.

48. Racionalismo: (1) Crença de que a razão humana (vista como o completo aparato do pensamento humano, incluindo sensação, memória etc) é o juiz último da verdade ou falsidade. (2) Crença de que a razão humana (como oposta à experiência sentida) é o caminho do conhecimento. VT cria que todos os incrédulos são racionalistas no primeiro sentido – e também [são] irracionalista (q.v).

49. Reductio ad Absurdum: Uma forma de argumento na qual, ao invés de provar diretamente uma conclusão, o argüidor reduz a conclusão contrária a um absurdo. Por isso é também chamado de “argumento indireto” ou “argumento a partir da impossibilidade do contrário”.[2] VT acreditava que todo argumento transcendental deve tomar esta forma. Frame discorda.

50. Auto-atestação, auto-autenticação: Em qualquer sistema de pensamento, a autoridade última justifica-se a si mesmo. Para VT, esta autoridade última é Deus, especialmente quando fala na Escritura. Ver Bahsnsen, 209 – 219, 715.

51. Senso de Deidade, Divindade (também, sensus deitatis, divinitatis, semen religionis): Maneira de Calvino descrever o conhecimento que o Incrédulo tem, mas suprime.

52. Ponto de Partida: Em VT, sinônimo de “pressuposição”. Portanto, isto não se refere necessariamente a um ponto de começo no tempo, mas sim, a uma crença que governa outras crenças.

53. Suaviter in modo, fortiter in re: Gentil na maneira, forte na substância. Descrição de VT de uma apresentação ideal da apologética. Ver Bahnsen, 441.

54. Suplementação: Em apologética, apresentar as verdades cristãs como alguma coisa simplesmente adicional ao que o não-cristão já crê. Ver “Metodologia Blocause”

55. Sistema: Tentativa de alguém expressar sua Cosmovisão em um conjunto coerente de ideias.

56. Que e O Que: VT critica alguns apologistas por tentarem provar que Deus é, sem considerar o que Deus é. Frame enfatiza que você nunca pode provar a natureza de Deus em um único argumento; portanto, o que é uma questão de grau. Nós não podemos, realmente, mencionar tudo. Mas, uma argumento apologético é coerente com tudo que a Bíblia diz sobre Deus". Ver “Unidade”. Ver Bahnsen, 217, 708.[3]

57. Argumento Transcendental: Um argumento que procura mostrar as condições necessárias para a possibilidade do pensamento racional ou discurso significante. VT acreditava que este era o único tipo de argumento apropriado para a Apologética Cristã, desde que o Deus Bíblico é o autor de todo significado e racionalidade.

58. Unidade, Todo (Defendendo o Cristianismo como um[a]): Defender os elementos particulares do Cristianismo com uma consciência das ligações de cada elemento com o sistema de verdade completo. Não provando tudo de uma vez, embora algumas vezes, VT parece quase exigir isto do apologista que ele critica. Ver Bahnsen, 26, 103n, 511.

59. Unívoco: (1) (Aquino) Linguagem que descreve o objeto literalmente. (2) (VT) Pensando de forma autônoma, e não de forma análoga (q.v), como se alguém fosse divino.

60. Cosmovisão (também visão do mundo-e-vida). Uma filosofia, particularmente uma metafísica. Uma maneira de entender a realidade que governa todo pensamento e vida.

Fonte: http://www.frame-poythress.org/frame_articles/2000VanTilGlossary.html


[1] Também conhecido como o Problema do “Uno e do Múltiplo”. É o problema clássico da Filosofia. Trata-se de como encontrar o(s) princípio(os) de unidade na diversidade do Cosmo.

[2] Alguns críticos de Van Til (e, especialmente de Bahnsen), têm dito que a frase “impossibilidade do contrário” não é correta, visto que as “Contrárias”(A [Todo S é P] e E [Nenhum S é P] no Quadro de Oposição) não podem ser ambas verdadeiras, mas podem ser falsas. É claro que se A é verdadeiro, então E é falsa. Porém, se A for falsa, o que é possível, então E não pode ser determinada, ou seja, poderia ser ou verdadeira ou falsa (Hurley, 7ed, 1999, p. 226). No entanto, tal só pode ser possível se ambas as proposições tiverem o mesmo sujeito e o mesmo predicado. Mas, sem dúvida alguma, observando os contextos de Van Til e Bahnsen, eles não pensavam na possibilidade do “Teísmo Cristão” e outras Cosmovisões terem o mesmo sujeito e predicado. Antes, a expressão “impossibilidade do contrário” implica em dizer que apenas o Cristianismo provê as pré-condições necessárias para a lógica, raciocínio, conhecimento, ciência, moralidade etc. Assim, coloca-se o Incrédulo em “choque” com suas pressuposições, demonstrando que ele vive de modo contrário (antagônico), à realidade, sendo impossível para ele viver de acordo com suas pressuposições. Ou seja, o incrédulo faz afirmações, mas vive contrário a sua base epistêmica. Assim, todas as Cosmovisões não apenas contradizem o Cristianismo, mas também são contrárias a Ele. “Ele [o apologista] desafia a adequação filosófica da cosmovisão do incrédulo, mostrando como ela não fornece as pré-condições para a inteligibilidade do conhecimento e da moralidade”(Bahnsen, 1998, p. 6, 7).

[3] Segundo Van Til, “no sistema de teologia e na apologética a doutrina de Deus é de fundamental importância. Devemos, primeiro, perguntar que (what) tipo de Deus o Cristianismo crer, antes de podermos, seriamente, perguntar com inteligência se tal Deus existe. O “o que” precede o “que”(that); a conotação precede a denotação; ao menos o último não pode ser discutido inteligentemente sem, pelo menos, considerar o primeiro”(The Defense of Faith, 1967, p. 9). Em outro livro, Van Til, após fazer uma crítica à Teologia Natural (que busca prova que (that) Deus existe, antes de demonstrar qual (what) Deus existe), pergunta: “Mas, existe algum ponto que procura provar que Deus existe a menos que saibamos o que é Deus?”(A Christian Theory of Knowledge, 1969, p. 278). Nas páginas indicadas por Frame, Bahnsen (p. 708) esclarece dizendo que esta distinção, embora correlativa e suplementativa uma a outra (p. 217), deve ser mantida na defesa da fé, especialmente com outras formas de teísmo. Citando Van Til, Bahnsen diz: “O apologista protestante não pode preocupar-se em provar a existência de qualquer outro Deus, a não ser aquele que tem falado ao homem autoritativa e finalmente nas Escrituras [...] Panteístas, deístas e teístas, que são teístas sem disfarces, podem formalmente concordar que Deus existe [...] Então, se todo debate na apologética é para ser mais que uma discussão sem sentido sobre que existência de Deus e é para considerar que tipo de Deus existe, então a questão da revelação de Deus ao homem deve ser trazida ao assunto”


Traduzido e Adaptado por Gaspar de Souza

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